sábado, 13 de outubro de 2012

Yuki, um cachorro adorável

Yuki decidiu atravessar a rua Dr. Barcelos e morar conosco, casa número 381. Ele era do vizinho da frente, um casal de professores com três filhos. Naquela época, meados de 1960, os cães eram livres. O normal era os cachorros passearem e voltarem pra casa para comer e dormir. Nenhum deles se perdia como hoje, todos voltavam. Quer dizer, alguns a carrocinha pegava e a gente tinha que ir arte a zoonose, no Hospital de Veterinária da UFRGS, buscar antes que eles virassem sabão, como se dizia. Minha mãe foi de táxi duas vezes buscar o Yuki.


Quando Yuki decidiu mudar de endereço eu devia ter uns 10 anos, ainda estudava no Grupo Escolar 3 de Outubro, a 3 quadras de casa. Yuki me seguia disfarçando. Eu olhava para trás e ele se escondia.

Mas quando eu chegava na escola lá estava ele, chegava antes e espera no portão. Um vira-lata enorme, preto e branco, com o rabo abanando alegremente por ter me enganado mais uma vez. As vezes ele conseguia ficar esperando a minha aula terminar deitado no corredor da escola. Outras vezes era espantado pelas funcionárias e aguardava na praça ou ia para casa.

Algumas vezes ele ia conosco até o ponto de ônibus, quando tínhamos de ir ao centro de Porto Alegre por algum motivo, e tentava entrar no ônibus. Uma vez ele conseguiu entrar e eu e minha avó descemos no ponto mais próximo para ele sair. Outras vezes ele corria atrás do ônibus até cansar, ou atrás do carro do meu pai, um fusquinha, que em Porto Alegre se diz “fuca”.

Yuki era um cão adorável. Também nos seguia quando meu irmão mais velho me levava para as Bandeirantes de carona na bicicleta. Era o Grupo Bandeirante Salamandra do Jarau. E esperava terminar a reunião dos sábados deitado na calçada na sombra de uma das árvores do Clube dos Jangadeiros, em frente ao rio Guaíba, que agora chamam de lagoa. Os tempos mudaram tanto que até a geografia foi junto. Ele também me esperava quando eu tinha aula de educação física, de manhã, nas quadras do Clube Comercial. Uma vez, quando a professora mandou que corrêssemos em volta da quadra de futebol de salão para aquecer, ele correu junto até ser expulso.

Um dia um carro parou em frente a nossa casa e uma cachorrinha foi colocada para fora. Uma vizinha viu e contou que foi assim que chegou a Bazuquinha. Esse nome horrível fui quem deu pra coitada. Yuki foi na calçada, cheirou a forasteira, deu boas vindas, e a convidou para entrar. Ninguém lá em casa contrariou. Bazuquinha foi acolhida primeiro pelo Yuki e depois por toda a família. Não tiveram filhotes e viveram felizes juntos uns 10 anos.

Quando Yuki partiu eu já estava casada, não morava mais na Dr. Barcelos, e recebei a notícia por meu pai que se referia a ele como “o falecido Yuki”. Bazuquinha partiu depois e eu já vivia em Brasília. Yuki protegia a casa e a família e era muito carinhoso. Até tiro levou protegendo a casa de um assalto. A bala pegou na boca e se alojou na mandíbula. Ele foi operado e tirou de letra. Morreu de velhinho, feliz, e sem sofrer, contou meu pai.

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